Por Gisele Bolonhez Kucek
Em 23/05/2023 foi proferida decisão monocrática pelo Ministro Alexandre de Moraes em que julgou procedente o pedido constante na Reclamação nº 59.795 para determinar a cassação dos atos proferidos pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região nos autos da RT nº 0010140.79.2022.5.03.0110, bem como a remessa dos autos à Justiça Comum.
Cinge-se o processo sobre a existência, ou não, de relação de emprego entre um motorista de aplicativo e a plataforma digital a qual presta serviços. No referido processo, a 11ª Turma do TRT da 3ª Região, entendeu pela existência dos requisitos autorizadores para concretização da relação de emprego.
Em face deste acordão, a plataforma digital ingressou com reclamação constitucional, tendo seu pedido julgado procedente, sob o fundamento de que a decisão reclamada acabou por contrariar resultados produzidos nos paradigmas invocados, bem como pela circunstância de que, segundo o Ministro, a relação mais se assemelharia a situação prevista na Lei nº 11.442/2007, do transportador autônomo.
Contudo, faz-se importante averiguar quais resultados produzidos pelo STF que teriam sido supostamente contrariados pela decisão do TRT da 3ª Região. Da análise dos fundamentos da decisão, percebe-se que os paradigmas de controle indicados são: a ADC 48, a ADPF 324, o RE 958.252 (Tema 725), a ADI 5835 e o RE 688.223 (Tema 590).
Isto porque, a ADC 48 reconheceu a constitucionalidade da Lei nº 11.442/2007, a qual disciplina o transporte rodoviário de cargas por conta de terceiros e mediante remuneração, declarando lícita a relação comercial de natureza civil e afastada a configuração de vínculo trabalhista neste tema.
Já a ADPF 324 e o RE 958.252 (Tema 725) reconheceram a licitude da terceirização ou de qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas. Ainda, o RE 688.223 (Tema 590) trata da incidência do ISS no licenciamento ou na cessão de direito de uso de programas de computação desenvolvidos para clientes de forma personalizada.
E, por fim, a ADI 5835 reconheceu a constitucionalidade da celebração de contrato civil de parceria entre salões de beleza e profissionais do setor, nos termos da Lei nº 13.352/2016, bem como reconheceu a nulidade do contrato civil, caso seja utilizado para dissimular relação de emprego.
Da análise destes paradigmas percebe-se que nenhum trata especificamente existência, ou não, de vínculo de emprego entre os motoristas de aplicativo e suas respectivas plataformas, não sendo possível, com a devida vênia, a cassação da decisão do TRT da 3ª Região.
Há um grande debate na Justiça do Trabalho brasileira a respeito da existência, ou não, do vínculo de emprego entre os motoristas de aplicativo e as respectivas plataformas, fenômeno conhecido como uberização. Temos decisões proferidas nos dois sentidos pelos diversos tribunais regionais, bem como pelo Tribunal Superior Trabalho, contudo, até a presente data não há uma decisão definitiva a respeito do tema.
A competência constitucional da Justiça do Trabalho é para o reconhecimento das relações de trabalho, especialmente verificando a existência dos requisitos autorizadores da relação de emprego.
Da análise da decisão monocrática percebe-se que não há um paradigma concreto sobre a uberização que tenha sido violado pelo TRT da 3ª Região. Ao contrário, há uma expectativa de que em breve o Judiciário solucione este impasse, tal qual o Judiciário de outros países já fizera. Assim, consoante os fundamentos da decisão, parece que não há um preceito concreto exarado pelo STF sobre o tema que tenha sido violado pelo TRT da 3ª Região.