Sociedade de Advogados Aspectos Polêmicos na Apuração de Haveres Sociais

Por Alfredo de Assis Gonçalves Neto

Considerações iniciais

1. A preocupação de manter o sigilo profissional no trato com os clientes, a natureza personalíssima da atividade intelectual desenvolvida pelo advogado e a preocupação com a exploração da advocacia por pessoas não habilitadas criavam barreiras para a aceitação de seu exercício por meio de uma sociedade na qual os trabalhos e os resultados dele advindos pudessem ser divididos com terceiros, advogados ou estranhos à profissão. Não se tratava de peculiaridade brasileira – tanto que nosso País foi um dos primeiros a admitir a reunião de advogados em sociedade –, mas da maioria dos países do sistema europeu-continental.

Empurrado pelos fatos[1], o legislador nacional normatizou a sociedade em referência na Lei 4.215/1963, dando-lhe este formato, destinado a conter um porvir que poderia comprometer os postulados da profissão: “Os advogados poderão reunir-se, para colaboração profissional recíproca, em sociedade civil do trabalho, destinada a disciplina do expediente e dos resultados patrimoniais auferidos na prestação de serviços de advocacia” (art. 77). Nasceu, assim, a primeira e até hoje única sociedade uniprofissional brasileira, com um conceito que não lhe permite o exercício da advocacia, mas, sim, o fornecimento do suporte para que a exerçam os sócios nela reunidos.

Outros cuidados também a cercaram, como a composição de seu nome com, ao menos, o de um advogado sócio, seu administrador; a obrigatoriedade de seu registro perante a Ordem dos Advogados do Brasil; a exigência de não possuir ou de excluir sócio com inscrição profissional cancelada; o não apresentar características tipicamente mercantis etc.

O vigente Estatuto da Advocacia e da OAB seguiu essa mesma linha: embora já sem conceituar a sociedade de advogados, dispôs, no ponto que aqui interessa, que “[N]ão são admitidas a registro nem podem funcionar todas as espécies de sociedades de advogados que apresentem forma ou características de sociedade empresária, que adotem denominação de fantasia, que realizem atividades estranhas à advocacia, que incluam como sócio ou titular de sociedade unipessoal de advocacia pessoa não inscrita como advogado ou totalmente proibida de advogar” (Lei 9.806/1994, art. 16).

No mais, ela passou a ser uma sociedade simples, não pelo fato de antes – isto é, no regime jurídico do Código Civil de 1916 – ter sido enquadrada como sociedade civil, mas por seu objeto destinar-se a proporcionar a seus sócios o exercício de uma atividade intelectual (CC, art. 966, parágrafo único).

Natureza sempre de sociedade simples

2. Devo esclarecer, a propósito, que não adiro à orientação sufragada por destacados autores, segundo a qual a sociedade que tem por objeto uma atividade intelectual pode tornar-se empresária, se tal atividade vier a se constituir em elemento de empresa.

Não é preciso enveredar aqui na demonstração de que elemento de empresa não é a própria empresa; em se tratando de sociedade, o dado distintivo entre sociedade simples e empresária, segundo o critério do Código Civil vigente, é o do objeto indicado no seu ato constitutivo e não a estrutura ou o modo como venha a exercê-lo (art. 982). Ora, se no momento da constituição da sociedade não há como saber como ela se apresentará no futuro, não faz qualquer sentido que, em determinado momento histórico, ela passe de simples a empresária, obrigando-se a se inscrever, portanto, no Registro Público de Empresas Mercantis e a cancelar sua inscrição no Registro Civil de Pessoas Jurídicas. O tipo da sociedade é determinado no momento de sua constituição e não muda ao longo de sua existência. 

Em se tratando de sociedade de advogados, nem é preciso adentrar nessa polêmica, visto que, afora a questão de seu objeto, sua própria lei de regência impõe a adoção do tipo “sociedade simples” (art. 15) e proíbe que seja registrada ou funcione se se revestir de qualquer dos tipos de “sociedade empresária” (art. 16, ambos já na redação que lhes deu a Lei 13.247/2016).

Contudo, não vejo necessidade de aprofundar a análise da questão de a atividade desempenhada por um escritório de advocacia poder ser ou não “elemento de empresa”, para fins do parágrafo único do art. 966 do Código Civil, porque ela me parece totalmente irrelevante para o enfrentamento do tema sob análise.

Normas aplicáveis

3. O importante é frisar que, a teor da Lei da Advocacia (art. 16), aplicam-se à sociedade de advogados as disposições nela previstas, complementadas com as codificadas que compõem o regime jurídico da sociedade simples, dentre as quais, v. g., as que tratam da responsabilidade dos sócios e da resolução[2] – rectius, do rompimento do vínculo societário – da sociedade em relação a sócio, onde estão regulados o falecimento, o direito de retirada e a exclusão (CC, arts. 1.028 a 1.032).

4. A singularidade da responsabilidade dos sócios na sociedade de advogados está em que, no âmbito da sociedade simples ela é ilimitada e subsidiária pelo cumprimento das obrigações sociais – ou seja, na falta de patrimônio social, cada sócio por elas responde na proporção de sua participação nas perdas sociais, salvo ajuste que os torne solidários (CC, arts. 1.023 e 1.024); já no regime especial da sociedade de advogados, a essa responsabilidade soma-se a que advém da relação cliente-advogado, que, nesse caso, torna advogado e sociedade solidários pelos danos que possam ter sido causados ao cliente em razão da atuação profissional (Lei 9.806/1994, art. 17 e 40 do Regulamento Geral da Advocacia).

Há, portanto, como observei ao escrever sobre as sociedades de advogado, “duas ordens de responsabilidade estabelecidas para os sócios: (i) uma decorrente da sua condição de sócio, regida pelos dispositivos do Código Civil que, tanto antes como agora, dispunham ser subsidiária e ilimitada pelas obrigações sociais.; e (ii) outra, derivada de sua conduta no exercício da advocacia.”[3]

5. No que concerne ao direito retirada, cumpre dizer que seu exercício, nas sociedades simples com prazo indeterminado, tem natureza potestativa, de modo que cabe exclusivamente ao sócio, quando e se lhe convier, decidir se o exerce ou não. É uma decisão severa, por implicar a abdicação de um de seus direitos essenciais, que é “o de se manter na sociedade, dela só podendo ser excluído segundo a casuística legal (CC, arts. 1.004, parágrafo único, e 1.030).”[4]  

Exatamente por ser potestativo, e por afetar um dos direitos essenciais, esse direito tem de ser exercido de modo formal, sem margem de dúvida, nos precisos termos do artigo 1.029 do Código Civil, isto é, “mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias.” Essa notificação, evidentemente, há de ser feita de maneira que possa ser comprovada, quer pela via judicial, nos termos da lei processual, quer extrajudicialmente, por carta com recibo de entrega, por mensagem eletrônica indicativa do recebimento ou pelo Ofício de Títulos e Documentos, para assegurar, a quem é destinada, a data exata da manifestação da vontade do sócio retirante, a partir da qual têm início seus efeitos e começa a fluir o prazo em que se dará seu desligamento.

6. Por outro lado, a exclusão é um direito que a sociedade exerce para resolver o vínculo societário em relação a um ou mais de seus sócios. Esse direito, diferentemente do de retirada, não é potestativo, pois depende da comprovação, em ação de natureza constitutiva, de o sócio ter cometido “falta grave no cumprimento de suas obrigações sociais” (CC, art. 1.030).[5]

Essa comprovação por meio judicial é impositiva precisamente para proteger o sócio contra eventuais, mas não raros, abusos da maioria, o que se dá quando os majoritários ou o controlador tentam, por exemplo, alijar o minoritário da divisão dos resultados sociais para rateá-los por um número menor de seus integrantes. Calha lembrar, nesse ponto, a advertência feita há mais de meio século por JOÃO EUNÁPIO BORGES quanto à participação de sócios sem poder de decisão em tipo societário contratual, os quais, bem recebidos por ser seu “capital precioso no início da sociedade, ou em seus momentos de dificuldade, passam a ser vistos com má vontade, logo que a empresa entra em fase de franca prosperidade.”[6]

É bem verdade que o artigo 4º, do Provimento n. 112/2006, do Conselho Federal da OAB, reproduzindo regra do Provimento n. 92/2000, estatui que os sócios podem excluir seus consortes por deliberação majoritária, mediante simples alteração contratual, nos termos previstos no contrato social. Essa norma regulamentar, contudo, não se atém aos limites que lhe são dados pelo vigente Código Civil, pois se afasta do enunciado contido em seu artigo 1.030, que vincula o direito de exclusão de sócio a uma justa causa judicialmente comprovada, não tendo, por isso, eficácia alguma. O regime jurídico da sociedade simples não contém norma semelhante à do artigo 1.085 do Código Civil, que chancela uma exclusão extrajudicial, aplicável, exclusivamente, às sociedades limitadas, ainda assim, com a condicionante nele prevista.

7. No que diz respeito às regras que complementam o tratamento da sociedade de advogados e lhe dão feições peculiares, merece ser destacada aqui a enunciada na última parte do artigo 16 do Estatuto da Advocacia e da OAB, que estatui a proibição de apresentar “forma ou características de sociedade empresária.

Antes de analisar essa norma é preciso lembrar que, em sua redação originária, tal proibição consistia em apresentar “forma ou características mercantis” – o que dificultava sobremodo entender seus limites. Na leitura que me pareceu mais consentânea com a realidade, aí estaria, apenas, um impedimento relativo à adoção de estrutura semelhante à das sociedades empresárias, isto é, a impossibilidade de a sociedade de advogados adotar “forma ou características de sociedades mercantis.[7] E foi, a meu sentir, como o mencionado Provimento n. 112/2006 interpretou a regra, ao dispor em seu artigo 2º, inciso X: “não são admitidas a registro, nem podem funcionar, Sociedades de Advogados que revistam a forma de sociedade empresária ou cooperativa, ou qualquer outra modalidade de cunho mercantil.” Esse enfoque, porém, não era assente, tanto que motivou acesa controvérsia entre comentaristas do Estatuto e em vários julgados dos tribunais pátrios, alguns vendo nesses vocábulos a vedação para a adoção de qualquer instituto inserido no campo do direito de empresa.

Contudo, a discussão a esse respeito parece-me hoje superada, porque, em sua redação atual, advinda com a Lei 13.247/2016, o citado artigo 16 deixou claro que não se consideram sociedades de advogados aquelas “que apresentem forma ou características de sociedade empresária.”

A nova redação da regra, aparentemente sutil, consciente ou inconscientemente realizada pelo legislador, eliminou a polêmica.

Efetivamente, não apresentar forma de sociedade empresária nada mais é do que não adotar os tipos que nessa espécie se enquadram, quais sejam: sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples ou por ações, sociedade limitada e sociedade anônima ou companhia.[8]

E não apresentar características de sociedade empresária é comando que envolve a análise daquilo que há de peculiar nos vários tipos de sociedade empresária e que não seja próprio do regime jurídico da sociedade simples, complementado pelas normas especiais que dispõem sobre a sociedade de advogados. Tem-se, então, exemplificativamente, (i) a solidariedade subsidiária dos sócios pelo cumprimento das obrigações sociais na sociedade em nome coletivo, sabendo-se que na sociedade simples e, portanto, na sociedade de advogados essa solidariedade é exceção; (ii) o aporte dos sócios como meros investidores nas sociedades limitadas (proibidos de conferir sua participação societária em serviços) e a limitação de sua responsabilidade, em contraste com a permissão, na sociedade simples, de haver sócio de trabalho e ser sua responsabilidade subsidiária e proporcional à sua participação, sobressaindo na sociedade de advogados a função de o advogado nela ingressar precisamente para prestar de serviços de advocacia; (iii) a presença de duas categorias de sócio nas sociedades em comandita simples e por ações, sendo os comanditários meros prestadores de capital, ao passo que na sociedade simples não pode haver essa distinção e que, em se tratando de sociedade de advogados, não há sócios com participação inativa; (iv) o fracionamento do capital social em títulos destinados à circulação, nos quais se materializam os direitos que atribuem a qualidade de acionista para quem deles seja titular e a possibilidade de emissão de valores mobiliários para captação de recursos, sem que os possa ter a sociedade simples.

Portanto, se dúvida havia quanto à extensão do significado de “características mercantis”, ela ficou desfeita com a nova redação da mencionada regra, na qual se vê que a barreira não se estende para além do ambiente societário.

A polêmica quanto ao fundo de comércio

8. Outra questão, ligada de certo modo a essa, é a que diz respeito à presença de fundo de comércio nas sociedades de advogado.

Antes de tudo é preciso dizer que o termo “fundo de comércio” foi consagrado legislativamente pela Lei de Luvas, como sinônimo de “estabelecimento comercial” ou, simplesmente, “estabelecimento”, no dizer do artigo 1.142 do Código Civil, que o define como “o complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária.”

O fato de o estabelecimento ser tratado no Livro II da Parte Especial do Código Civil, que contém o estatuto da empresa, não está a indicar que sua aplicação se restringe ao empresário, à empresa individual de responsabilidade limitada e às sociedades empresárias. Toda atividade econômica organizada exige alguma estrutura para seu exercício. Efetivamente, como já anotei,

“O agente econômico não empresário, a igual do que ocorre com o empresário, precisa, como este, de um estabelecimento para o desempenho das atividades econômicas a que se propõe. Refiro-me ao estabelecimento da sociedade simples, onde se inclui a cooperativa, ao do empresário rural e ao daquele que exerce profissão intelectual. Qualquer desses estabelecimentos, à semelhança do que ocorre com o estabelecimento do empresário, pode ser objeto unitário de direitos, caso em que, na falta de outras disposições normativas, são-lhe aplicáveis, por analogia, as regras dos preceitos legais atinentes ao estabelecimento do empresário (mercantil).

Com essa observação, sempre que o texto se referir a estabelecimento de empresário, ou a estabelecimento empresarial, está a abranger os estabelecimentos de quem quer que exerça atividade econômica, mesmo daquele excluído do conceito de empresário sujeito à inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis.”[9]

Isso assentado, pode-se afirmar que, a não ser excepcionalmente, não se concebe a prática da advocacia sem uma estrutura mínima de apoio, isto é, sem um estabelecimento para seu exercício. E a organização e tamanho dessa estrutura variará em função da intensidade e do modo de exercer a profissão. É certo que a locução “fundo de comércio” soa estranha à luz das regras do Código de Ética e Disciplina da profissão; mas a estranheza está só na expressão, porque a realidade o torna praticamente indispensável, identificando-o com a designação de “escritório de advocacia”.

9. De modo geral, a doutrina e a jurisprudência têm determinado a inclusão do valor do fundo de comércio no cálculo dos haveres de sócio nas sociedades empresárias e simples, divergindo quanto a estas, porém, quando destinadas ao exercício de profissão ou atividade intelectual.

A primeira indagação que se coloca, então, é a de saber o que, na apuração de haveres de sócio, por ruptura do vínculo societário (nos casos de falecimento, retirada ou exclusão), deve ser computado a título de fundo de comércio.

Nesse cenário, quantificar o “fundo de comércio” ou o “estabelecimento” implica buscar, não o valor de cada qual dos bens que o integram, mas o da aptidão do conjunto unitário que deles resulta para a consecução de sua função – ou seja, o valor do aviamento, daquele acréscimo que se agrega à somatória do valor dos bens em si considerados, formando a unidade autônoma a que se refere o artigo 1.146 do Código Civil.

É bem verdade que a doutrina pátria é praticamente uníssona em considerar que o aviamento não é um bem do estabelecimento, mas uma qualidade ou atributo dele. E é assim porque o aviamento não existe por si, isoladamente na natureza; ele tem existência vinculada ao estabelecimento ou, como se costuma dizer, existe no estabelecimento, como a fertilidade existe no solo, a velocidade no automóvel e assim por diante. O fato, porém, é que todo atributo ou qualidade afeta o valor do bem a que está agregado.

E isso não é diferente no estabelecimento, cujo valor varia, para mais ou para menos, consoante for sua qualidade – id est, seu aviamento. A particularidade está em que esse aviamento só se revela quando se tem de determinar o valor do estabelecimento, como se dá, por exemplo, no trespasse, na alienação de participações societárias, nas operações de concentração empresarial e no desligamento de sócio.

Tratando do tema, depois de me referir ao posicionamento de autores que “negavam a possibilidade de inclusão do valor do fundo de comércio nas chamadas dissoluções parciais de sociedade”, mencionei a orientação prevalecente, segundo a qual

deixar de conceder essa verba ao sócio que falece, retira-se ou dela é excluído implicaria referendar o enriquecimento da sociedade e dos sócios remanescentes à custa do empobrecimento daquele que também contribuiu com sua quota e participação para a formação desse fundo, que, muitas vezes, possui valor econômico superior ao dos demais bens corpóreos que, como ele, integram o patrimônio social.” [10]

A dificuldade estaria em firmar uma posição prévia e uniforme a respeito, em razão das variáveis que se nos deparam na análise de cada caso concreto, quando devem ser “dimensionadas as particularidades que poderão justificar ou não a inserção do fundo de comércio no cálculo do valor da quota do sócio em relação ao qual é rompido o vínculo societário.

10. Se a existência de um estabelecimento na sociedade simples e, bem assim, na de advogados, é inquestionável, coloca-se, então, a segunda questão, que é a de saber se tal estabelecimento pode ter o aviamento que emana da atividade intelectual a ele conferida por seus sócios.

Na verdade, tudo o que se pode – e se costuma – fazer nessa seara é, também, um juízo de fato, no sentido de que, em princípio, não haverá, nas sociedades de profissão intelectual, aí incluídas as sociedades de advogados, elementos imateriais aptos a se destacar da pessoa do profissional e passar à estrutura societária por ele integrada.

É que, “nas sociedades que têm por objeto o exercício de profissões regulamentadas, o fundo de comércio é uma grandeza difícil de determinar, já que, normalmente, prevalece o vínculo pessoal entre o sócio e o cliente.” Na sociedade de advogados, partindo do pressuposto de que ela não exerce a advocacia e que, portanto, o cliente vincula-se “… à pessoa do advogado que lhe presta os serviços ou que coordena a atuação advocatícia,” sustentei, reportando-me à obra específica que escrevi sobre o tema, que a “apuração de haveres de sócio que se desliga de uma sociedade de advogados não comporta determinação do valor do fundo de comércio.”[11]

No trabalho ali referido, contudo, deixei clara a ressalva quanto à possibilidade de haver exceções, aclarando ser “… partidário do entendimento de não haver – pelo menos em regra – fundo de comércio nas sociedades de advogados…”[12]

A inexistência de “fundo de comércio” – ou, mais bem dito, de um aviamento para o estabelecimento –, como regra, nas sociedades de advogados, decorre, como antes explicado, do fato de que, na generalidade dos casos, “… a sociedade de advogado não possui cliente, já que este se vincula à pessoa do advogado que lhe presta os serviços ou que coordena a atuação advocatícia”. Ou seja, ordinariamente, “… a relação de confiança…”, que leva o cliente a buscar os serviços dessa, e não daquela banca, “… não decorre da organização, mas da qualificação e da competência profissional” de seus integrantes. E é, realmente, esse juízo de fato que está na base da recorrente afirmação no sentido da inexistência de aviamento nas sociedades de profissionais. Deixam-no claro, por exemplo, os seguintes excertos de conhecido artigo de TERCIO SAMPAIO FERRAZ JUNIOR:

“… no caso das sociedades formadas para o exercício de atividades profissionais liberais, em função da confiança pessoal, não se pode falar em fundo de comércio propriamente dito”.

(…)

“… se, particularmente no Brasil, o fundo de comércio é tido como universalidade de fato cujo fundamento é a atividade organizatória, o que permitiria atribuir a essa organização um valor superior ao da soma dos elementos em que se desdobra, o capital e o trabalho, no caso das sociedades de profissionais liberais, cujo centro aglutinador é a excelência profissional personalíssima, não há como ir-se além daqueles elementos, não se podendo falar em fundo de comércio”[13].

Como se vê, está na raiz da afirmação da ausência de “fundo de comércio” – ou, mais precisamente, da ausência de aviamento do estabelecimento –, nas sociedades de profissionais, a premissa de que a contratação se dá “… em função da confiança pessoal…” em determinado profissional, como “… centro aglutinador…” formado em razão da “…excelência profissional personalíssima”.

11. Ocorre que, se tal apontamento é verdadeiro para a generalidade dos casos, devo reconhecer que não o é para todos. Há escritórios de advocacia, embora muito poucos[14], que têm, na sua estrutura, um dos principais – senão o principal – fatores de atração para determinados clientes.

Isso é marcante, por exemplo, no contencioso de casos repetitivos, em que são muito mais importantes do que a habilidade profissional dos advogados especificamente destacados para cada atendimento, fatores como (i) a capilaridade da sociedade, que a capacite a atender a processos em vários pontos do território nacional; (ii) o número de advogados disponíveis para a realização de audiências, participação em sessões de julgamento e peticionamento; (iii) a eficiência dos sistemas de pagamento de custas, de geração de relatórios e quetais; (iv) a eficiência dos controles de qualidade das manifestações; (v) a existência de um bom seguro de responsabilidade civil; (vi) a existência de um sistema de compliance, que evite desvios de conduta etc. Como se sabe, o atendimento focado nesses fatores, de tão impessoal, vem sendo cada vez mais feito com o auxílio de robôs, ainda que sob o controle de um advogado com conhecimento necessário para gerenciá-los.

Mas há um outro grupo de casos, em certo sentido opostos aos mencionados no parágrafo anterior, em que o fator estrutural também se faz inegavelmente decisivo na escolha do cliente: refiro-me, aqui, aos clientes que buscam atendimento integral (full service), que nenhum advogado isoladamente conseguiria prestar, o que é especialmente relevante em operações complexas, que envolvem a atuação de setores especializados, tais como aquelas de que o Consulente informa cuidar habitualmente a sociedade de advogados em questão.

Ora, já não se pode mais seriamente considerar, nesses casos, que a “… confiança pessoal” ou a “… excelência profissional personalíssima” seriam os principais fatores para a escolha de uma sociedade de advogados em detrimento de outra. O cliente vai ao escritório porque entende que só um escritório bem estruturado – e não um advogado singularmente considerado – tem condições de atender plenamente à sua necessidade.

Registro, nesse ponto, que muitas vezes o cliente até é inicialmente atraído pelas qualidades pessoais e profissionais de um determinado advogado, mas, depois de um primeiro contato, segue sendo atendido pela banca em novos casos, mesmo que o advogado inicialmente buscado não tenha nenhuma relação com o setor do escritório que está a prestar o novo atendimento. Nesses casos, pode-se dizer que o cliente busca o escritório em razão da competência de determinado profissional e da confiança pessoal nele nutrida, mas segue vinculado ao escritório por conta da estrutura que lhe foi proporcionada; e, justamente por isso, não deixa a banca em razão da saída do sócio que inicialmente motivara a sua aproximação com o estabelecimento.

12. Tem-se observado, por isso, tanto na doutrina como na jurisprudência, nacional e estrangeira, a existência de um cuidado em ressalvar os casos excepcionais para gizar, como eu mesmo fiz, em passagem anteriormente transcrita, que apenas “em regra” não há fundo de comércio nas sociedades entre profissionais. 

Interessante notar que, em julgado da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no qual se concluiu, por maioria, pela inexistência de fundo de comércio em uma sociedade de engenheiros, houve essa preocupação, de ressalvar as exceções. Nesse sentido, o voto do Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, que, embora tenha acompanhado o relator, admitiu a possibilidade de haver sociedades de profissionais a cujos estabelecimentos se possa atribuir valor decorrente de aviamento[15]:

Os exemplos mencionados indicam o que habitualmente acontece em se tratando de sociedades formadas para o desenvolvimento das atividades técnicas de seus sócios. Evidentemente, há exceções, pois, ainda com base nos exemplos dados, é certo que existem escritórios de advocacia que falam por seus próprios nomes, bem como há sociedades formadas por engenheiros que constituem verdadeiras sociedades empresárias de geração e circulação de riquezas, o que leva à conclusão de que a uniformização do entendimento sobre a questão de o fundo de comércio compor ou não a avaliação para retirada de um sócio certamente levará a hipóteses de práticas injustas. Cada caso deve ser mensurado particularmente, no sentido de se aferir se, realmente, existe o goodwill ou se os valores incorpóreos acompanham as pessoas dos sócios.

É de ser destacado, também, o voto do Ministro LUÍS FELIPE SALOMÃO no sentido de que fosse reconhecida, naquele caso, a existência do fundo de comércio:

“Com efeito, a análise acerca da existência ou não de fundo de comércio, em se tratando de sociedade não empresária, deve ser casuística, haja vista que a sua atuação no mercado pode assumir inúmeras formas.

(…)

Ora, se a resposta ao quesito formulado pela própria recorrente registrou que o seu valor nem sempre está ligado às pessoas, sendo o nome TESC sinônimo de garantia, ressoa patente que, não obstante o objeto social seja a prestação de serviços de engenharia e projetos, a atividade desempenhada não é exclusivamente intuitu personae, sendo forçoso concluir que a clientela é obtida pela segurança que o nome alcançou no mercado.

(…)

Em verdade, não há meios de comparação entre um engenheiro, escultor ou advogado, que produzem de acordo com sua aptidão, inspiração e disposição pessoais, com uma sociedade cujo nome é sinônimo de garantia do seu produto.

Com efeito, no mercado, os profissionais liberais de renome notório atraem os clientes de maneira pessoal, ainda que atuando em sociedade, mas quando há um conjunto de bons profissionais em atividade junto à mesma instituição, a sociedade ou ‘empresa’ passa a ter um significado diferente”.

Outros julgados, de tribunais locais, seguem exatamente essa linha, de identificar, a partir da análise de cada caso concreto, a existência ou não de aviamento nos estabelecimentos de sociedades não-empresárias[16].

13. Na literatura estrangeira são encontradiças assertivas como a seguinte, de JAMES COTTERMAN: “Claramente, em algumas situações de fato, pode haver um ‘ongoing concern’ que é independente da pessoa do alienante [da participação societária em sociedade de advogados]. É também claro que, em algumas situações de fato, esse não é o caso”. Segundo o mesmo autor, “[D]esde que os clientes primeiramente contratam advogados, em vez de seus escritórios, esse seguirá sendo um princípio norteador na avaliação das sociedades de advogados”; no entanto, é de se reconhecer que alguns escritórios chegam ao ponto de criar uma “… ‘identidade de marca’, que é separada e distinta para a instituição…”, bem como que, muitas vezes, “… a equipe (incluindo outros sócios e outros especialistas) influencia a escolha do cliente”[17].

No mesmo sentido, colho a observação contida em julgado da Corte de Cassação italiana, que, apesar da rigidez com os postulados éticos da profissão, reconheceu a possibilidade de cessão do estabelecimento de um escritório de advocacia, com o seu aviamento:

“Sem prejuízo da manutenção dos tradicionais princípios da confiança da relação e do caráter pessoal da prestação, está-se testemunhando uma superação da consideração do trabalho intelectual como independente do momento organizacional, levando em conta – como tem observado a doutrina – as novas tendências relativas à comercialização, a especialização e a socialização.

Essa evolução é apoiada pelas alterações na legislação: [cita uma série de alterações legislativas que apontaram nesse sentido]; (…)

De tais tendências a jurisprudência desta Corte é testemunha (…), na medida em que reconhece que mesmo os escritórios profissionais podem ser organizados em forma de estabelecimento, sempre que o perfil profissional da atividade desenvolvida é ladeado por uma organização dos meios e das estruturas, um número de sócios e funcionários e uma amplitude de locais empregados para o exercício da atividade, a tal ponto que o fator organizacional e a extensão dos meios utilizados sobreponham-se à atividade profissional dos sócios, ou, pelo menos, coloquem-se, em relação a ela, como entidade jurídica dotada de uma relevância estrutural e funcional própria, que, embora não separada da atividade do advogado, é dotada de importância econômica.

(…)

Não faltam precedentes desta Corte em tal direção. De fato, definiu-se (…) que o contrato de cessão-venda de um escritório profissional, conjuntamente aos elementos que o constituem, e mesmo em relação à clientela a que faça jus, mediante o pagamento de determinada quantia, é válido e lícito com base no princípio da autonomia contratual, que permite às partes celebrar contratos atípicos, desde que dirigidos a realizar interesses dignos de proteção jurídica; além disso, tem-se observado ultimamente que, embora não seja possível a transferência da clientela, em sentido técnico-jurídico, é juridicamente configurável a cessão de um escritório profissional juntamente com o seu aviamento, consistente em uma qualidade desse escritório, a qual resta assim transferida, como complexo de elementos organizados para o exercício da atividade profissional, munido do atributo essencial e necessário constituído pelo aviamento.

(…)

Deve-se, portanto, conclusivamente afirmar o seguinte princípio de direito: ‘É lícito e válido o contrato de transferência a título oneroso de um estúdio profissional, compreensivo não só dos elementos materiais e da mobília, mas também da clientela, sendo configurável, em relação a esta, não uma cessão em sentido técnico (…), mas um compromisso amplo do cedente voltado a promover a continuação da relação profissional entre os antigos clientes e o adquirente”[18].

14. Ordinariamente, quando o advogado deixa a sociedade que integrava, carrega consigo precisamente a fatia de valor imaterial que seu bom nome emprestava à estrutura. No entanto, em casos como o os acima referidos, em que a estrutura atinge um nível acima do ordinário, não pode haver dúvida de que boa parte dos elementos imateriais, que se amalgamaram à sociedade durante a permanência de um determinado sócio, não são por ele levados quando se desliga do quadro social.

Em situações assim, há uma perda patrimonial efetiva do sócio que se desliga, a qual, sem a compensação adequada, provoca um acréscimo injustificável ao patrimônio dos sócios remanescentes e, não fosse a inamovível motivação para a deliberação de exclusão de sócio, impeditiva de cláusulas de expulsão desmotivada pela lei brasileira, brechas estariam abertas para o oportunismo, como se deu neste caso, relatado por DOUGLAS RICHMOND:

“Finalmente, falando de atuação em proveito do interesse econômico próprio, considere-se o caso em que uma sócia sênior é daquelas ‘que faz chover’ na sociedade. Ao longo dos anos, ela veio institucionalizando seus clientes, envolvendo seus sócios e associados mais jovens em todos os aspectos de sua representação, e permitindo que eles interagissem diretamente com a gerência sênior desses clientes. Tais sócios gostariam de redistribuir a generosa remuneração da sócia sênior. Partindo do princípio de que a sociedade não perderá clientes se a sócia sênior a deixar, em razão de que outros sócios se tornaram familiares aos clientes e conseguirão manter os negócios com a sociedade, resolvem excluí-la, valendo-se de uma “cláusula de guilhotina”, prevista no acordo de sócios. A expulsão da sócia sênior, nesse caso, é uma clara violação, pelos sócios remanescentes, do dever de boa-fé e negociação justa, pois se dá com um objetivo predatório, sem que haja sequer sugestão de que a sócia sênior estivesse com desempenho abaixo do esperado; seus colegas simplesmente cobiçavam sua parte nos lucros sociais. A exclusão também constitui má-fé sob a análise dos custos de contratação. Os sócios remanescentes, ao agir assim, procuram esquivar-se de um custo de seu contrato original, havendo para si, ou para seus apaniguados, a parcela do lucro que caberia à sócia sênior. A sócia sênior não poderia razoavelmente esperar que a sociedade a expulsaria por fazer o que todas as sociedades desejam que os sócios façam: desenvolver novos negócios e institucionalizar os clientes que eles atraíram, de tal modo que esses clientes remanesçam leais à sociedade mesmo que ela a deixe, aposente-se ou fique incapacitada.[19]

Dificuldades a considerar

15. Não é tarefa simples, porém, determinar qual parcela desse valor imaterial está ligada à pessoa do sócio e qual fração está ligada ao estabelecimento social. Não há dúvida de que o sócio de uma sociedade de advogados com uma estrutura complexa como as antes descritas, leva consigo, ao sair, algo do que deu à sociedade, mas deixa nela, imbricado, outro tanto de si, como um valor que se destaca de sua pessoa e passa a compor o patrimônio imaterial dela – o que pode variar em razão de fatores os mais diversos, como a posição de estaque que tal sócio ocupava na organização, a contribuição prestada para o crescimento da sociedade etc.

Dou-me conta, de todo modo, que um bom ponto de partida para essa análise pode ser encontrado mediante o resgate de uma classificação que os comercialistas fazem há pelo menos um século, mas que tem aparecido apenas de passagem em discussões como a que é versada neste estudo: trata-se da diferenciação, que já tive ocasião de apontar, entre o aviamento objetivo (ou real) e o subjetivo (ou pessoal)[20], ou, se se preferir, entre o personal goodwill e o corporate goodwill (institutional goodwill ou business goodwill), na expressão dos anglo-saxões.

Sobre o tema, vale a pena destacar alguns excertos da festejada obra de OSCAR BARRETO FILHO, que, a partir das lições pioneiras de MARIO ROTONDI, distinguiu entre (i) “… o aviamento dito objetivo ou real…”, definido como aquele “… inerente aos elementos singulares do estabelecimento, às suas qualidades, à sua organização e também à atividade do fundador enquanto transfundida e objetivada no estabelecimento…” e (ii) “… o aviamento dito subjetivo ou pessoal, que deriva da pessoa e do prestígio do titular e que lhe é indissoluvelmente unido”[21].

Como bem observara aquele grande comercialista, “… o aviamento de todo estabelecimento, in concreto, é o resultado não só do conjunto da organização dos fatores de produção (bens e serviços), como também da atividade e das qualidades pessoais do comerciante (habilitada, cortesia, honestidade)”; porém, é “… difícil determinar a importância relativa de cada uma das causas…”[22].

A distinção, é claro, tem relevância precisamente porque “…somente se pode considerar como inerente ao estabelecimento, independentemente do titular, o aviamento objetivo, que, sendo uma qualidade ou atributo do objeto do direito, com ele se transmite ao novo titular”[23].

16. Para os norte-americanos, a diferenciação entre o personal goodwill e o company goodwill tem relevância tributária e, por isso, é bastante estudada[24]. Ademais, ela é considerada importante quando se trata de avaliar os bens dos cônjuges para fins de divórcio, dado que o denominado “personal goodwill” costuma ser excluído da avaliação do patrimônio do casal[25]. Mas os operadores do direito locais também costumam destacar que “[D]istinguir entre ‘personal goodwill’ e ‘corporate goodwill’ é providência a ser tomada em qualquer avaliação de sociedade, especialmente naquelas de caráter profissional e naquelas dirigidas pelo próprio empreendedor”[26]. Os critérios para identificar a existência do corporate goodwill em sociedades de advogados estão normalmente ligados ao tipo de relação que os clientes têm com ela:

Escritórios de advocacia grandes e bem conhecidos também possuem ‘business goodwill’. Os clientes frequentemente buscam os serviços dessas bancas não em razão das habilidades de um advogado em particular, mas em razão de que a sociedade, como entidade, tem a reputação de contratar bons advogados. (Aliás, os advogados que prestam os serviços para os clientes serão rotineiramente alterados). É claro que nem todos os clientes que contratam tal espécie de escritório sentir-se-ão confortáveis trabalhando com qualquer de seus advogados. Alguns advogados têm qualidades que podem influenciar a escolha do escritório pelo cliente. Mas, como regra geral, os clientes contratam esses escritórios a despeito da alta rotatividade entre seus integrantes. Escritórios dessa natureza são os que, ao longo dos anos, adquiriram ‘business goodwill’”[27].

17. Para além da relação com a clientela, ainda há outros fatores a levar em conta. Diz-se, nesse sentido, que

“Começar um negócio envolve criar contatos comerciais, relações bancárias, relações com fornecedores, projetar e equipar o espaço, encontrar e treinar pessoal, criar formas e procedimentos e gerar fluxo de caixa. Esses itens compõem o ‘institutional goodwill’. Qualquer pessoa que já tenha começado o negócio entende o valor de uma entidade cujos negócios estão em marcha”[28].

Na mesma linha, diz DANIELE BALDUCCI que “…quem adquire uma empresa em funcionamento aceita o ‘valor de transferência’ ao cedente, querendo evitar os riscos do insucesso e as despesas de sua implantação”. [29].

A tendência é que, ordinariamente, nos estabelecimentos sem caráter empresarial, reconheça-se apenas um valor menor do aviamento objetivo, em comparação com o subjetivo. Num estudo de caso que tinha por objetivo, justamente, a avaliação de uma específica sociedade de atividade profissional (de engenharia, na espécie), concluiu-se o seguinte:

“…. o faturamento e o consequente lucro neste tipo de empresa estão diretamente vinculados à presença de seus sócios. São eles que possuem os contatos e as competências individuais, portanto são detentores de ‘goodwill’ pessoal. No caso da Empresa Sigma, o ‘goodwill’ empresarial apresentou pouca expressão monetária em relação ao total do ativo da empresa, sugerindo uma característica das empresas profissionais”[30].

Essa tende a ser a resposta, repita-se, para a generalidade das situações, notadamente em se tratando de sociedades de advogados cuja esmagadora maioria é composta por um pequeno número de sócios. No entanto, nos grandes escritórios de advocacia e naqueles em que o trabalho só pode ser desenvolvido em equipe, não comportando o suor de um só, como nos exemplos apontados (n. 11 supra), o aviamento objetivo tende a superar o aviamento subjetivo. Em que extensão isso se verificará, apenas uma avaliação promovida por especialista poderá dizer, até porque, na lição de DANIELE BALDUCCI, “[N]a realidade dos estabelecimentos singularmente considerados, fatores de aviamento subjetivo e objetivo aparecem combinados entre si de diversos modos”[31].

18. No estudo de casos e nos apontamentos da doutrina especializada, vários métodos podem ser encontrados para apartar um do outro. Sem pretender definir algo que é da competência de outra área do conhecimento, o que se tem observado, ordinariamente, é o partir-se da identificação do valor total do aviamento, usando algum dos métodos conhecidos – como o fluxo de caixa descontado, por exemplo – para, em seguida, decotar dele o aviamento subjetivo.  O que restar da operação “goodwill total” menos “personal goodwill” será o “corporate goodwill”.  A distinção entre uma e outra categoria pode ser feita, por exemplo: (i) definindo critérios de identificação do caráter preponderantemente pessoal ou impessoal da escolha dos clientes e atribuindo-lhes pesos conforme se verifique um ou outro caso (fala-se em “multiattribute utility models” – MUM); ou (ii) usando o “’with and without’ method”, pelo qual o analista avalia a sociedade duas vezes: uma considerando a presença e outra considerando a ausência de determinado sujeito, com vistas a mensurar a redução do fluxo de caixa que provavelmente decorrerá da saída de determinado sujeito da sociedade[32].

Nas avaliações de sociedades de advogados, costuma-se levar em conta, para fins de mensurar o aviamento subjetivo, a seguinte hipótese: se o advogado a quem se predica fatia relevante do aviamento deixar a sociedade, os clientes seguirão com ele ou permanecerão na sociedade? De modo talvez intuitivo, é o que se tem feito em alguns julgados que identificaram a existência de aviamento em sociedades não empresárias. Nesse sentido, por exemplo, o Tribunal de Justiça de São Paulo, ao determinar que se apurasse o fundo de comércio de determinada sociedade de médicos, igualmente ordenou que se procedesse ao “[A]batimento de parte do aviamento, em razão da clientela que acompanhará o sócio excluído”[33].

Os intangíveis

19. A terceira questão que se coloca é a de saber se, na apuração de haveres de sócio que se retira de uma sociedade de advogados devem ser inseridos ou não os chamados intangíveis, isto é, outros bens imateriais para além do aviamento, que também o é.

A palavra “intangível” advém das Normas Internacionais de Contabilidade, instituídas pela International Accounting Standards, e passou a ser de uso corrente entre nossos contabilistas antes mesmo de ser incorporada ao direito positivo nacional. Foi a Lei 11.638/2007 que incluiu os intangíveis nas disposições sobre o balanço patrimonial das sociedades por ações, mais especificamente na conta do ativo, definindo-os como “os direitos que tenham por objeto bens incorpóreos destinados à manutenção da companhia ou exercidos com essa finalidade, inclusive o fundo de comércio adquirido” (Lei 6.404/1976, art. 179, inc. VI).

A partir de então, a prática contábil adotou o termo amplamente, para nele incluir todos os bens e direitos incorpóreos ou imateriais, mesmo sem título atual para permitir seu lançamento na escrituração,[34] tanto que se enumeram, como intangíveis, não só o aviamento, mas marcaspatenteslicençassoftwaresdireitos autorais e de propriedade industrialknow howsistemas eletrônicos etc.

20. E foi com essa noção que o artigo 606, caput, do Código de Processo Civil, fez uso do qualificativo “intangíveis”, para determinar o valor dos haveres no balanço de sua determinação, em razão dos quais, na lição dos processualistas, “é necessário aferir os bens e direitos imateriais, tais como marca, clientela, capacidade de geração de lucro etc.[35]

Nessa concepção tão abrangente enquadram-se como intangíveis, de modo geral, os direitos já existentes no momento considerado (de desligamento do sócio, de trespasse do estabelecimento etc.), porém, ainda não realizados. Entram nessa categoria no que tane às sociedades de advogados, dentre inúmeros outros exemplos, os créditos a receber obtidos em processos judiciais, como os oriundos de reparação de danos ou de repetição de indébito tributário, aos quais falta título para figurarem na escrituração.

Cláusulas limitativas e arbitragem

21. Diante dessas dificuldades as sociedades de advogados devem, primeiramente, afastar-se de modelos pré-elaborados para dispor a respeito de assunto tão complexo. Ao depois, têm de sopesar as particularidades da atividade advocatícia que por meio delas será exercida e procurar redigir as cláusulas de convivência futura, notadamente a de pagamento de haveres de sócios que delas se desligam (por morte, retirada ou exclusão) com toda a cautela, para amenizar constrangimentos que podem ocorrer no futuro.

Já o disse certo autor que, no momento da constituição de uma sociedade, os futuros sócios encontram-se em plena harmonia e não pensam nas possíveis desavenças do porvir; quando estas surgem, dão-se conta que as normas ajustadas pouco ou nada ajudam, trazendo, muitas vezes, perplexidades antes inimaginadas. As divergências acabam parando no Poder Judiciário e se refletindo na clientela.

22. Não há receita exata para uma gama tão variada de situações, desde a do advogado extremamente ligado a seus clientes até a da indiferença deles em relação ao profissional que se dedica a defender seus interesses. Se a apuração de haveres de um advogado que participa de uma sociedade dedicada a causas repetitivas possibilita a adoção de um critério relativamente simples para a determinação do que lhe é devido, na outra ponta há aquele que atua numa sociedade de advogados voltada para o contencioso, cuja receita depende de fatores externos, incertos e improgramáveis.

A liberdade de contratar e o princípio da intervenção mínima, consagrado na Lei da Liberdade Econômica, permitem que os sócios definam da maneira que melhor lhes aprouver as fórmulas de apuração e pagamento dos haveres. Sob esse entendimento, já asseverei que

“É licito, inclusive, estabelecer critérios de apuração diferenciados para cada qual das hipóteses de resilição, resolução, ou simples extinção dos vínculos societários. Assim, nada impede que, para a retirada excluam-se valores (como os dos intangíveis, que não o sejam em caso de falecimento ou de exclusão e assim por diante. Esse ajuste insere-se no campo da liberdade de contratar e só precisa valer de modo uniforme para qualquer dos sócios.[36]

É possível, por igual, que seja estabelecida uma norma, segundo a qual o sócio de trabalho ou de serviços perceba participação no acervo social ou, apenas, nos lucros acumulados. E não há restrição a que sócios de qualquer categoria, que ingressam na sociedade no curso de sua existência, não participem, quando dela saírem, de recebíveis futuros, sejam ou não decorrentes de serviços por ele prestados.

De resto, tem sido frequente a prefixação de haveres para evitar apuração futura ou a vinculação dessa apuração a dados objetivos com fórmulas rígidas, objetivando simplificar o procedimento. No entanto, é preciso certa cautela na adoção dessa alternativa, visto que uma tal disposição é sempre questionada em ração da alteração das circunstâncias supostas ao tempo de tal ajuste.[37]

Mediação e arbitragem

23. Como se observa, esta exposição poderia seguir indefinidamente, com o apontamento de outras alternativas. Mas é o que basta para acentuar as dificuldades que o tema apresenta. O cenário fica mais sombrio quando se imagina a necessidade de intervenção do Poder Judiciário para solucionar as divergências que costumam surgir a respeito, notadamente levando-se em conta que não a matéria não se insere no dia-a-dia da prestação jurisdicional e que raros são os magistrados que, sem qualquer vivência, por ela mostram interesse e conhecimento.

Por isso, parece-me fundamental que os contratos sociais insiram a mediação para a tentativa de solução amigável de conflitos societários; fundamental é, também, a submissão desses conflitos à arbitragem, preferentemente junto à Seccional da OAB onde esteja registrada a sociedade (se dispuser do serviço), dentro do possível já elegendo o(s) árbitro(s), como o exigia nosso Código Comercial oitocentista, com pacto de confidencialidade para preservar o sigilo que norteia a atuação dos profissionais da advocacia. Pode não ser a solução ideal, mas ameniza as agruras.

____________________


[1]A primeira sociedade de advogados brasileira foi constituída na década de 1950 por Richard Momsen, diplomata norte-americano que se formou em direito no Brasil, em parceria com Edmundo Miranda Jordão. Pegou a OAB de surpresa, pois os estatutos e controles internos nada previam a respeito. No entanto, à falta de norma regulando a prestação de serviços de natureza intelectual ela foi celebrada com base no art. 1.371 do Código Civil de 1916, que autorizava, genericamente, a formação de sociedade particular “para executar em comum certa indústria ou exercer certa profissão.”

[2] Como já observei em outra passagem, o termo “resolução”, adotado pelo Código Civil de 2002, só se presta para o rompimento do vínculo societário em relação ao sócio que é excluído da sociedade, sendo é inadequado para abranger os casos de falecimento e de retirada voluntária. (Direito de Empresa – Comentários aos arts. 966 a 1.095 do Código Civil. 9ª. ed. São Paulo: Thomson Reuters Revista dos Tribunais, 2019, p. 298, n. 226.)

[3] Sociedade de Advogados, 7ª. ed. São Paulo: Lex Editora, 2016, n. 46, p. 148).

[4] Ibid., p. 146, p. 219.

[5] O dispositivo menciona, ainda, a “incapacidade superveniente” e, em se tratando de sociedade de advogados haveria, também, a perda da habilitação profissional como causa de exclusão (Estatuto da OAB, art. 16, última parte), impondo-se a tutela jurisdicional para o desligamento do sócio em caso de resistência.

[6] BORGES, João Eunápio. Curso de Direito Comercial Terrestre. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1964, p. 278-279.

[7] Sociedade de Advogados, cit., n. 9, p. 44.

[8] A sociedade em conta de participação, para os que a consideram como um tipo societário, pode ser simples ou empresária, mas também não se prestaria para o exercício da advocacia por ter no sócio participante um mero investidor. Por outro lado, a sociedade cooperativa não é empresária, mas não se presta, igualmente, como tipo para a sociedade de advogados por ter natureza híbrida, com ela incompatível.

[9] Direito de Empresa – … cit., n. 630, p. 669.

[10] Direito de Empresa – …, cit., n. 249, p. 321, primeira coluna.

[11] Ibid., n. 249, p. 321, segunda coluna.

[12] Sociedade de advogados, cit., n. 66, p. 222.

[13] Da Inexistência de Fundo de Comércio nas Sociedades de Profissionais de Engenharia. In: Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, n. 111, jun./1998, p. 50-51.

[14] O Conselho Federal da OAB registrou em 26.06.2020 o total 1.199.282 advogados (Disponível em: https://www.oab.org.br/institucionalconselhofederal/quadroadvogados). Os escritórios de advocacia voltados a atender processos repetitivos ou dedicados a áreas especializadas de atuação profissional, que exigem uma estrutura como a narrada, não chegam a 10.000 e, portanto, nada significam diante daquela grandeza.

[15] STJ, REsp 958.116/PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha. Rel. p/ Acórdão Min. Raul Araújo, 4ª Turma, j. 22/05/2012, Dje 06/03/2013. Sem os destaques, no original.

[16] Nesse sentido, destaco os seguintes precedentes:

(i) DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE COM APURAÇÃO DE HAVERES. Incontroversa a falta de affectio societatis entre os três únicos sócios de sociedade simples, alegada na inicial e admitida em contestações. Insurgência que se circunscreve à indenização do fundo de comércio em sociedade simples de prestação de serviços médicos. O fundo empresarial (goodwill) normalmente deve compor o valor dos haveres do sócio retirante, pois constitui ativo intangível, mas economicamente mensurável. Nas sociedades que têm por objeto o exercício de profissões regulamentadas, contudo, deve ser aferido caso a caso a existência de aviamento. Existência aviamento indenizável de clínica cardiológica com 25 anos de funcionamento e sólida carteira de clientes, constituída especialmente de planos de saúde, cujos contratos são celebrados em nome da pessoa jurídica. Saída de um dos três sócios que provocará na tural retraimento do número de consultas, a refletir no valor do aviamento. Parcial provimento do recurso, para reduzir em 1/5 o valor do aviamento. (…). TJSP; Apelação Cível 9179375-90.2009.8.26.0000; Relator (a): Francisco Loureiro; Órgão Julgador: 6ª Câm. de Direito Privado; Foro Regional II – Santo Amaro – 4. Vara Cível. Julg. em 02/02/2012; Registro: 03/02/2012;

(ii) DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE COM APURAÇÃO DE HAVERES. Insurgência que se circunscreve à indenização do fundo de comércio em sociedade empresária de médicos. O fundo empresarial (goodwill) normalmente deve compor o valor dos haveres do sócio, pois constitui ativo intangível, mas economicamente mensurável. Nas sociedades que têm por objeto o exercício de profissões regulamentadas, contudo, deve ser aferida caso a caso a existência de aviamento. Sociedade de médicos prestadores de serviços reunidos em clínica tradicional, estabelecida há vinte anos em bom ponto, com sólida clientela, inclusive de planos de saúde. Existência de aviamento que se traduz pelo atrativo à clientela decorrente do bom nome, da tradição e dos contratos de plano de saúde. Abatimento de parte do aviamento, em razão da clientela que acompanhará o sócio excluído. Recurso provido em parte. (TJSP; Agravo de Instrumento 2045721-19.2015.8.26.0000; Relator (a): Francisco Loureiro; Órgão Julgador: 1ª Câm. de Direito Privado; Foro de Santo André – 6ª. Vara Cível. Julg. em 20/10/2015; Registro: 21/10/2015);

(iii) (…) 2.2. APURAÇÃO DE HAVERES. SOCIEDADE SIMPLES DE MÉDICOS. VALORAÇÃO DO PATRIMÔNIO INCORPÓREO (GOODWILL) POSSIBILIDADE. ESTRUTURA EMPRESARIAL DO ESTABELECIMENTO QUE ULTRAPASSA A CONDIÇÃO PERSONALÍSSIMA PROFISSIONAL DOS SÓCIOS. Mesmo se tratando de uma sociedade simples composta por médicos, é cabível, no caso, a apuração do fundo de comércio (goodwill empresarial) para valoração da participação societária, visto que a estrutura organizacional agrega valor incorpóreo, ultrapassando a condição personalíssima da atividade dos sócios. (…) (TJPR – 18ª C.Cível – 0021772-47.2014.8.16.0021 – Cascavel – Rel.: Des. Péricles B. de Batista Pereira –  J. 19.09.2018).

[17] Tradução livre dos seguintes excertos: “Clearly in some fact situations there may be an ongoing concern that is independent of the seller. It is also clear that fact situations exist where this is not the case”; “As long as clients primarily hire lawyers, as opposed to firms, this will remain a guiding principle in valuing law practices”“… ’a brand identity’ that is separate and distinct to the institution…”“…the servicing team (including other partners and other practice specialities) influence the client’s selection decisions”. COTTERMAN, James D. Valuation of a Law Firm and a Law Practice. Copyright  ©. USA AltmanWeil Inc., 2014, p. 5-7.

[18] Tradução livre. No original: “Accanto al permanere dei tradiciozionali principi della fiduciarietà del rapporto e della personalità dela prestazione, si assiste infatti ad un superamento della considerazione dell’opera intelettuale como irrelata dal momento organizzativo, tenuto conto –  come è estato osservato in dottrina – delle nuove tendenze verso la commercializzazione, la specializzazione e la socializzazione. Questa evoluzione è assecondata dal formante normativo; (…) Di tali tendenze è testimone la giurisprudenza di questa corte (…), quando precisa que anche gli studi professionali possono essere organizzati in forma di azienda, ogni qualvolta al profilo personale dell’attività svolta si affianchino un ‘organizzazione di mezzi e strutture, un numero di titolari e dipendenti ed un’ ampiezza di locali adibiti all’attività, tali che il fattore organizzativo e l’entità dei mezzi impiegati sovrastino l’attività professionale del titolare, o quanto meno si pongano, rispetto ad essa, come entità giuridica dotata di una propia rilevanza strutturale e funzionale che, seppure non saparata dall’attività del titolare, assuma una rilevanza economica. (…) In tale direzione non mancano precedenti di questa corte. Si è infatti precisato (…) che il contratto di cessione-vendita di uno studio professionale nell’insieme degli elementi che lo costituiscono e pure in relazione alla clientela che ad esso faccia capo, mediante il versamento di una somma, è valido e lecito in base al principio dell’autonomia contrattuale, che consente alle parti di concludere anche contratti che non appartengono ai tipi aventi una disciplina particolare, purchè siano direttia realizzare interessi meritevoli di tutela secondo l’ordinamento giuridico; e si è ulteriormente rilevato che, sebbene non sia possibile in senso tecnico-giuridico il trasferimento della clientela, è giuridicamente configurabile la cessione di un studio professionale insieme con il suo avviamento, consistente in una qualità di detto studio, il quale viene cosi trasferito, quale complesso di elementi organizzati per l’esercizio dell’attività professionale, munito dell’attributo esenziale e necessario costituito dall’avviamento. (…) Deve pertanto conclusivamente affermarsi il seguente principio di diritto: ‘È lecitamente e validamente stipulato il contratto di trasferimento a titolo oneroso di uno studio professionale, compreensivo non solo di elementi materiali e degli arredi, ma anche della clientela, essendo configurabile, con riferimento a quest’ultima, non una cessione in senso tecnico (…), ma un complessivo impegno del cedente volto a favorire (…) la prosecuzione del rapporto professionale tra i vecchi clienti ed il soggetto subentrante” Corte di Cassazione; sezione II civile; sentenza 9 febbraio 2010, n. 2860. Pres. Elefante, Est. Giusti, P. M; Leccisi (concl. Conf); Cantone (Avv. Amoroso) c. V. Serges (Avv. Spampinato, G. Serges). Conferma App. Catania 16ottobre 2004.

[19] Em tradução livre.  No original: “Finally, with  respect  to  economic  self-interest, consider a case in which a senior partner is a major rainmaker at her firm. Over the years, she has institutionalized her clients by involving younger partners and associates in all aspects of their representations and by allowing them to interact directly with the clients’ senior management. The other partners would like to redistribute the senior partner’s generous compensation among others in the firm. On the theory that the firm will lose no clients if the senior partner leaves because other partners who are familiar to the clients from their representations will be able to retain the business, the firm expels the senior partner pursuant to the guillotine expulsion provision in the partnership agreement. The senior partner’s expulsion plainly violates the remaining partners’ duty of good faith and fair dealing under the excluder approach. The firm expelled her for a predatory purpose. There was no suggestion that the senior par1ner was underperforming in any fashion; her colleagues simply coveted her share of the firm’s profits. The expulsion also constitutes bad faith under cost-of-contracting analysis. The remaining partners are seeking to avoid a cost of their original agreement by keeping the senior partner’s share of the firm’s profits for themselves or for distribution to favored colleagues. The senior partner could not have reasonably expected that the firm would expel her for doing what all firms want all partners to do develop new business and institutionalize the clients they attract so that those clients remain loyal to the firm even if the partner leaves. retires, or becomes disabled.” RICHMOND, Douglas. Expelling Law Firm Partners, 57 Clev. St. L. Rev. 93 (2009). Disponível em https://engagedscholarship.csuohio.edu/clevstlrev/vol57/iss1/6.

[20] “Todo estabelecimento possui seu aviamento, variando o respectivo valor para mais ou para menos em razão dos fatores em que se assenta, os quais podem ter caráter (i) objetivo, como os inerentes aos bens singulares do estabelecimento, às suas qualidades, à organização ou (ii) subjetivo, como os decorrentes da pessoa, do prestígio e do modo de agir do empresário. Essa distinção entre aviamento objetivo e subjetivo assume importância não só para a tipificação de algumas hipóteses legais de concorrência ilícita, como para a interpretação de convenções que lhe são limitativas nos negócios que têm por objeto a alienação do estabelecimento (venda, locação, usufruto etc.), porque os fatores de ordem objetiva se transferem normalmente, ao novo titular, ao passo que os de natureza subjetiva só se transferem indiretamente (através de cláusulas proibitivas, expressas ou implícitas, do exercício da mesma atividade pelo alienante, de manutenção de assistência etc.)…” – Direito de Empresa…, cit., p. 678.

[21] Teoria do Estabelecimento Comercial. São Paulo: Max Limonad, 1969, p. 174.

[22] Ibid., p. 173.

[23] Ibid., p. 176.

[24]  É o que explicam ADAM HERMAN e MICHAL DEVEREUX: “One major reason to value the level of personal goodwill in a business is because of the double taxation involved in the sale of assets that C Corporations hold. In the sale of a C Corporation’s assets, all gains are taxed at the corporate tax rate, which has a top rate of 35 percent. Soon the rate will be 21 percent, under the tax reform bill. The C Corporation must then distribute the proceeds of the sale to the shareholder. The proceeds are then taxed again at the shareholder level, typically at the capital gains tax rate of 23.8 percent (which is the qualified dividend rate of 20 percent plus the 3.8 percent Medicare surtax). However, if personal goodwill can be carved out of the sale and attributed to the business owner, and not as an asset of the corporation, the gain allocable to the personal goodwill from the sale is only taxed once, as personal assets of the shareholder are taxed at the capital gains rate of 23.8 percent” – Bottom Line: Personal Goodwill Indicates the Value of a Mold Shop for Sale – MoldMaking Technology, v. 21, fev-2018, p.38. É também a explicação dada por NICK GRUIDL, AMY KASDEN e PETER ENYART: The presence of personal goodwill can provide tax-efficient opportunities in merger-and-acquisition transactions by lowering corporate-level tax upon a sale or transfer of goodwill. Further, the gain on a sale of personal goodwill is generally considered capital gain and receives a preferential capital gains tax rate (assuming the goodwill has been held by the taxpayer for more than 12 months), as opposed to the higher ordinary income tax rate for the receipt of compensation. With current federal corporate tax rates as high as 35%, a selling shareholder’s direct sale of personal goodwill can often generate significant tax benefits. In addition, the buyer in such a transaction receives an amortizable step-up in asset basis upon acquiring personal goodwill from the seller, which would not occur if all the amounts paid were considered paid for the corporation’s stock”. Personal goodwill: alive and well indeed! The Tax Adviserv. 46, 2015, p. 250.

[25] SHEPHERD, Diana. The Distinction Between Personal and Enterprise Goodwill. Family Law Magazine, n. 28, set-2012. Disponível em https://familylawyermagazine.com/articles/personal-versus-entity-goodwill/. Um autor relata que aproximadamente metade das cortes de família nos Estados Unidos adota essa posição, segundo a qual apenas o enterprise goodwill integra o patrimônio comum do casal, sendo o personal goodwill patrimônio separado do cônjuge que o detém – BROWN, Frank. Personal Goodwill and Corporate Goodwill within the Family Law Context. In Insights2017, p. 10-14. Disponível: http://willamette.com/insights_journal/17/spring_2017_2.pdf.

[26] Em tradução livre. No original: “Distinguishing between personal goodwill and corporate goodwill should occur in any business valuation, especially in professional practices and owner-managed firms”. COMPTON, Jeff; SHAPIRO, Michal. Personal Goodwill and Firm Value. 2018. Disponível em: https://cw-cpa.com/personal-goodwill-and-firm-value/

[27] Em tradução livre. No original: “(…) Large, well-known law firms also possess business goodwill. Clients often seek the services of such firms not because of the skills of any particular lawyer, but because this firms, as entities, have reputations for employing fine lawyers. (Indeed, the lawyers that perform services for any given client will change routinely.) Of course, not all clients who hire such a firm are comfortable working with any of its lawyers. Individual lawyers have qualities that may have influenced the client’s choice of firm. But as a general rule, clients hire these firms despite high turnover among their individual lawyers. These firms have, over the years, acquired business goodwill””. IBRAHIM, Darian. The Unique Benefits of Treating Personal Goodwill as Propoerty in Corporate Acquisitionis. In: Delaware Journal of Corporate Law, v. 30, 2005, P. 8. Disponível em: https://scholarship.law.wm.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=2733&context=facpub.

[28] Em tradução livre. No original: “Starting a business involves creating business contacts, banking relationships, vendor relationships, designing and outfitting space, finding and training staff, creating forms and procedures and generating cash flow. These items comprise institutional goodwill. Any individual who has started a business understands the value of an ongoing entity” COTTERMAN, James D. Valuation of a Law Firm and a Law Practice., cit., p. 6.

[29] Tradução livre. No original: “…chi acquisisce un’azienda funzionante riconosce al cedente un ‘valore’di avviamento, volendo evitare i rischi di insuccesso e i costi di impianto – La Valutazione dell’Azienda. 9ª ed. Fag: Milão, 2006, p. 34.

[30] SANTOS, Nivaldo João dos. BORNIA, Antonio Cezar. Avaliação de Empresas: o caso de Determinação do Valor de Goodwill em Empresa Profissional. InXXX Encontro Nacional de Engenharia de Produção. São Carlos-SP, Brasil, 12 a 15 de outubro de 2010. Disponível em http://www.abepro.org.br/biblioteca/enegep2010 _tn_sto _126 _810_14955.pdf.

[31] Em tradução livre. No original: “Nella realtà delle singole aziende, fatttori di avviamento soggetivi e oggetivi risultono tra loro combinati in vario modo”.  La Valutazione dell’Azienda, cit., p. 35.

[32] COMPTON, Jeff; SHAPIRO, Michal. Personal Goodwill and Firm Value2018. Disponível em: https://cw-cpa.com/personal-goodwill-and-firm-value/pdf

[33] TJSP.  Agravo de Instrumento 2045721-19.2015.8.26.0000; Relator (a): Francisco Loureiro; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santo André – 6ª. Vara Cível. Julg. em 20/10/2015; Registro em 21/10/2015.

[34] Observo que ao aludir a “fundo de comércio adquirido”, a lei só está a permitir o lançamento desse valor na escrituração quando for realizado em um negócio jurídico que verse sobre sua aquisição, o que não significa que ele antes não o possuísse.

[35] CAMBI, Eduardo; DOTTI, Rogéria; PINHEIRO, Paulo E. d’Arce; MARTINS, SANDRO Gilbert; KOZIKOSKI, Sandro Marcelo. Curso de Processo Civil Completo. 2ª. ed. São Paulo: Ed. Thomson Reuters Revista dos Tribunais, 2019, p. 1.373, nota 18.

[36] Direito de Empresa…, cit., n. 244, p. 315.

[37] Sobre o tema, do autor, Direito de Empresa…, cit., n. 246-A, p. 317-318.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *