Debate confronta aspectos positivos e polêmicos do uso da mediação na recuperação judicial


O auditório do escritório Assis Gonçalves Kloss Neto Advogados sediou, nesta quinta-feira (13/6), a 7ª edição do Café com Mediação – Capítulo Paraná. O evento, promovido pelo Instituto de Direito de Recuperação de Empresas (IDRE), discutiu o uso da mediação (-) na recuperação judicial da empresa.


A advogada paulista Joice Ruiz, mestre em Direito Comercial, falou sobre a atuação dos administradores judiciais na mediação. “Sou totalmente contra, pois a mediação tem a sua lei própria, precisa de imparcialidade e confidencialidade”, sustentou, argumentando que o administrador judicial é auxiliar do juízo e que entre seus deveres está a transparência, justamente para diminuir a assimetria entre a informação que existe entre o devedor e o credor. Para Joice, o administrador judicial deve atuar em outras frentes, como a fiscalização de atividades da empresa em recuperação judicial, o cumprimento do plano de recuperação e da arrecadação e venda dos bens.

A juíza da 1ª Vara de Falência e Recuperação Judicial do Paraná, Mariana Fowler Gusso, defendeu que o mediador favorece o diálogo e estimula a comunhão de interesses. “A ideia de mediação é muito salutar para aprovar o plano de recuperação judicial e evitar a falência”, disse. Mariana destacou que a solução não pode ser imposta; deve ser um denominador comum alcançado pelas partes. “A cultura da judicialização ainda prevalece, mas temos casos bem positivos de audiência de conciliação, principalmente em relação aos bens das empresas”, explicou. Para Mariana, a mediação não é a forma mais comum, mas é relevante tanto para casos de recuperação judicial quanto de falência.

Rodolfo Salmazo, diretor institucional do IDRE, lembrou que há 38 menções de mediação previstas no Código de Processo Civil (CPC). “Me parece que a modalidade já nasceu com mais força”, disse. O advogado explicou que o CPC destaca a imparcialidade, a autonomia de vontade e a confidencialidade como características da modalidade. “Este último ponto – a confidencialidade -, assim como o sigilo, são inadequados para o caso de recuperação judicial, dada a necessidade da transparência”, pontuou. Em tom ameno, Salmazo elencou outros pontos críticos da mediação nos casos de recuperação judicial. “Na prática ainda não vi a efetividade da mediação nestes casos”, destacou.

Para o advogado Eduardo Agustinho, professor de Direito Empresarial da PUC – PR, atualmente a grande dificuldade da recuperação judicial é a falta de celeridade. “A mediação pode ajudar a encontrar caminhos para que a recuperação judicial seja mais rápida e efetiva”, afirmou. Agustinho ressaltou que a mediação pode ser utilizada para reverter a recuperação judicial mesmo após a aprovação do plano de recuperação. “O mediador pode fazer a diferença.”

A advogada e mediadora empresarial Alessandra Bonilha destacou que a mediação pode ser uma alternativa em todo o ciclo de vida da empresa. “Ela é um instrumento para resolver problemas e deve ser uma ferramenta para os advogados”, disse. Alessandra também explicou que a alternativa traz qualidade para o processo de negociação. “A mediação traz eficácia, celeridade e está alinhada aos princípios da recuperação judicial”, argumentou.

Em contrapartida, para Oksandro Gonçalves, professor de Direito Empresarial da PUC-PR, o custo da mediação se tornou elevado. “Cobra-se o mesmo que em uma arbitragem. Tenho dúvidas se é um diferencial em relação à recuperação judicial”, afirmou. “Tenho mais dúvidas: quem banca esse custo? A empresa que já está em dificuldade?”, questionou. Gonçalves também apresentou dúvidas quanto aos prazos e ao caráter da mediação. “Me parece que o termo negociação se aplicava melhor. É um espaço mais apropriado”, ponderou. Ele destacou que a cultura da negociação não é bem desenvolvida. “Em muitos casos vemos situações que são pautadas não pela negociação e nem pela mediação, mas pelo medo”, afirmou. Para o advogado, o aspecto da neutralidade também merece ser mais debatido, “o mediador precisa estar inteirado da situação da empresa, o que já o retira da zona de neutralidade.”

O advogado e professor Alfredo de Assis Gonçalves Neto, sócio do escritório AGKN, tratou da mediação na recuperação extrajudicial, lembrando que, por tradição, desde o decreto nº 2.024 de 1908, se o devedor propusesse a chamada “concordata branca”, corria o risco de ter o pedido de sua falência feito por algum credor. “Hoje também devemos ter cuidado com a solução extrajudicial, pois ela pode precipitar um indesejável pedido de falência dos credores com títulos vencidos”, destacou. Para ele, a característica da recuperação extrajudicial é a flexibilidade para negociar classes distintas de situações de crédito, selecionando alguns credores. O advogado não vê problema em propor um acordo trabalhista nesse modelo. “Por que não? Não sei o porquê de pré-excluir os credores trabalhistas da recuperação extrajudicial, se a maioria deles aceitá-la”, disse. “Há, portanto, uma complexidade pela redução dos créditos que se sujeitam à recuperação extrajudicial. Aliás, trata-se mesmo de recuperação extrajudicial, já que é exigida a homologação do juiz?”, questionou. O professor Assis Gonçalves sublinhou que prefere o termo recuperação judicial pré-pronta. “Afinal, no fundo, ela depende da atuação do juiz, tanto para implementá-la, como para resolver incidentes no curso de sua execução”, argumentou. “Concluo que é absolutamente indispensável o assessoramento jurídico para que o processo de mediação em vez de ser solução não culmine com a derrocada da empresa.”

O advogado Carlos Alberto Farracha de Castro, presidente da Comissão de Estudos de Recuperação de Empresa e Falência da OAB Paraná, abriu sua apresentação mencionado a mudança de paradigmas do direito de insolvência. Ele relembrou do alerta do professor Assis Gonçalves, de quem foi aluno nos anos 90, sobre a clareza necessária para as regras de insolvência. “Ainda que a mediação não esteja bem implantada, estamos trocando a cultura do litígio pela da negociação”, afirmou Farracha de Castro. Segundo ele, na Europa, há princípios norteadores a balizar a insolvência. “Será que temos de adotar também aqui princípios como esses para escaparmos ao litígio e à ineficiência do processo judicial?”, questionou o advogado.

Na etapa de ponderações finais, Assis Gonçalves destacou que é preciso derrubar o preconceito que ronda os advogados que lidam com casos de recuperação judicial. “Precisamos de mais especialização no ramo, sobretudo da parte dos magistrados”, destacou, aventando a hipótese de criação de varas especializadas e de preparação de magistrados para assumi-las. “Há poucos juízes com conhecimento do assunto. Aliás, saúdo a doutora Mariana Gusso, aqui presente. É raro que magistrados participem de cursos e debates sobre o tema. Isso é fundamental”, lembrou. “Não se conseguiu até hoje uma legislação mais ampla por conta das peculiaridades, mas temos de avançar. A mediação pode auxiliar nisso, especialmente com a chamada recuperação judicial pré-pronta”, ressaltou.

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